segunda-feira, 20 de outubro de 2025

Notas sobre a não-linguagem artística (João Francisco Duarte Jr.)

cadeira sendo pintada com tinta óleo
Época Mouco
O professor João Francisco Duarte Júnior tem em seu currículo a Psicologia, mas dedicou-se à Arte-educação e à Filosofia da Educação para preencher as lacunas científicas do Brasil quanto ao tema quase inexplorado na década de 80. Por que arte-educação? (1983) é um livro do século que passado que ainda traz à tona tanto a questão curricular como visão popular da arte. 

Duarte Júnior vai então adotar uma abordagem reflexiva contínua, a posição da arte na escola, a formação docente e a própria essência da arte. Para valorizar e ensinar de forma eficaz, é importante ir além de definições superficiais e abraçar sua complexidade. E é isso que Duarte Júnior propõe neste livro breve, didático e provocativo

Arte é sentir ou comunicar?

Cores sendo misturadas com pincel.
Negar a arte como uma linguagem é polêmico. Mas Duarte Júnior argumenta que, ao contrário das linguagens verbais, as formas artísticas não podem ser reduzidas a símbolos com significados traduzíveis. O autor defende que o sentido da arte reside em sua própria forma, não em uma representação decodificável.
Ele é um artista não tanto em virtude de seus próprios sentimentos, quanto de seu reconhecimento intuitivo de formas simbólicas do sentimento, e sua tendência a projetar conhecimento emotivo em tais formas objetivas. Ao manipular sua própria criação, ao compor um símbolo de emoção humana, apreende, da realidade perceptiva à sua frente, possibilidades da experiência subjetiva que ele não conhece em sua vida pessoal.
(LANGER, Susanne. Sentimento e forma. São Paulo, Perspectiva, 1980, p. 405)

Mas... e a literatura?

Engana-se quem imagina que em matéria de Literatura, o autor defenderá a arte-linguagem. Aqui ele esclarece que a literatura, embora utilize a linguagem verbal, não se limita à transmissão de informações. 

A literatura vai explorar ao máximo a linguagem para criar sentido, expressar e evocar emoções com a poesia, por exemplo, assim como as artes plásticas. Nesse sentido, a literatura se torna um laboratório que comprova a tese de Duarte: a arte não é um mero código.

E onde fica a Educação nisto tudo?

Para conhecedores de educação, esta perspectiva se contrapõe à Base Nacional Comum Curricular (BNCC), que categoriza a Arte como uma das linguagens, ao lado de Língua Portuguesa, Língua Inglesa e Educação Física. No entanto, essa contradição pode ser vista como uma oportunidade para aprofundar a discussão sobre a verdadeira natureza da arte

Talvez a categorização da arte como linguagem nos documentos oficiais resulte em uma visão utilitarista da arte, que prioriza o desenvolvimento de competências lógicas e pragmáticas, negligenciando o papel crucial da mesma no desenvolvimento integral do indivíduo.

E ainda é comum encontrar-se, nas aulas de arte, a proposta de confecção de presentes para o "dia dos pais", "das mães", "das crianças" etc. Além de, em geral, serem "presentes" pré-fabricados, que o aluno deve recortar, colar e colorir, reforça-se a atitude consumista presente entre nós. Transmite-se, sem questionamentos, uma ideologia de consumo que instituiu semelhantes datas com fins estritamente lucrativos.

A linguagem, embora expressiva e delimitadora, pode, em seus códigos de linhas, formas, cores e contextos, construir algo que, como Duarte Júnior observa, a enquadra em uma visão utilitarista.

Falando em educação, que tal ler Jan D. Matthews: uma nova pedagogia para destruir a escola tradicional

O que concluímos?

Mas, ainda que a troca (educação) deva ocorrer, eu, como estudante de Arte-educação, acredito ser necessário deixar-se levar pela viagem interpretativa e compreender o poder expressivo e a capacidade da arte em transformar a nossa visão de mundo. A arte é fundamental para a expressão, sensibilidade, pensamento crítico e criatividade, indo além de um conjunto de técnicas. Nas palavras de João Francisco Duarte Júnior "a arte mantém acesa a imaginação e a utopia" - e é somente isso que importa!

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