sinto-me estranho mas já vai passar / não se morre de estranheza, mas pode-se morrer de saudade (p. 237)
Falar de luta e saudade é falar da América Latina desestruturada pela Ditadura Militar. Em Primavera num espelho partido (1982), o escritor uruguaio Mario Benedetti explora as diferentes perspectivas sobre o encarceramento de Santiago, personagem-preso-político, e como sua ausência afeta a vida de quem sente pela sua falta. O livro aborda o amor, fidelidade, a passagem do tempo e as escolhas enfrentadas por aqueles que esperam por alguém.
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Cárcel de Miguelete en Montevideo (UY) |
O exílio é uma partida solitária. E quando vai, parece-me que devemos aprender a desgarrar-se. A saudade vem junto, talvez com mais peso do que qualquer bagagem. No livro, o exílio é descrito como uma “partida sem ninguém”, um abandono forçado, onde até os sonhos e projetos carregam o peso da solidão e da incerteza. Não há recepção calorosa, nem acolhimento. É um desenraizamento.
Depois de 5 anos de exílio, a vida deve continuar. Deve seguir (algum rumo?). O retorno é uma experiência de estranheza. O passado já não existe, assim como as projeções que se faziam sobre ele, agora se desfazem, tornando a experiência de volta profundamente estranha.
A vida continua, dizem e repetem as canções banais ou, se não o dizem, pelo menos insinuam. E como são as canções banais que dizem isso, nós, os sensatos, descartamos radicalmente essa xaropada. E, no entanto, em tudo o que é cafona há sempre uma semente de realidade. (p. 209)
Montevideo (UY) |
Del exlio al “desexilio”
O exílio de Mario Benedetti (1974 a 1985), foi um período de grande atividade e compromisso político. Ele viveu na Argentina, Peru, Cuba e Espanha. Durante esse tempo, Benedetti desenvolveu uma "cultura do exílio", que se reflete em sua obra. Para ele, o exílio era um fato existencial que devia ser analisado e incorporado à identidade pessoal e, consequentemente, à sua literatura. Ele cunhou o termo desexílio para se referir ao seu retorno ao Uruguai em 1985, enfatizando a necessidade de compreensão e reflexão crítica de todos, tanto os que ficaram quanto os que se exilaram.
BENEDETTI, Mario. Primavera num espelho partido. Tradução de Eliana Aguiar. Rio de Janeiro: Alfaguara, 2018.
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