Minas Gerais é o berço da mineração no país e também do poeta Carlos Drummond de Andrade. Em 1965, ele escreveu um poema-alerta sobre o Pico Itabirito, um amontoado rochoso constituído de minério de ferro com aproximadamente 1586 metros de altura.
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Pico Itabirito em 1956 | Vitto Rocco Melillo / IEPHA-MG |
O Pico Itabirito está localizado na região da Serra das Serrinhas em Itabira, uma cidadezinha no centro de Minas Gerais. O Pico encontra-se em uma área potencialmente atrativa para as mineradoras de ferro. Em 1940, o terreno foi vendido para uma companhia britânica de mineração e atualmente pertence à Vale.
Com o passar dos anos, o Pico Itabirito está se tornando cada vez menos imponente. Quem segue de São Paulo pela BR-040 em direção a Belo Horizonte, pode observar esse cenário apocalíptico de perto: escavadeiras e caminhões trabalhando 24 horas por dia na destruição do entorno do Itabirito.
"Não à mineração contaminadora a céu aberto. Sem água, sem vida." Adesivo no Norte da Argentina, um dos principais produtores de lítio no mundo. |
Para conter a destruição total, na década de 60, o Itabirito foi tombado e pouco tempo depois destombado. Anos mais tarde, em 1989, ele foi novamente tombado, registrado, por fim, até hoje, como um patrimônio geológico pelo Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico (IEPHA-MG).
Apesar disso, as cicatrizes da mineração ficarão de Norte a Sul do país, assim como em todo Planeta, como marca da irresponsabilidade ambiental e da espoliação do capitalismo.
O PICO DE ITABIRITO - Carlos Drummond de Andrade
O pico de Itabirito
Será moído e exportado
Mas ficará no infinito
Seu fantasma desolado.
Com tanto minério em roda
Podendo ser extraído,
A icominas se açoda
E nem sequer presta ouvido
Ao grave apelo da história
Que recortou nessa imagem
Um outro azul da memória
E um assombro da paisagem.
St. John del rey mining sai,
Mais hanna mais icominas
E sem dizer água-vai
Serram os serros de Minas,
Nobres cimos altaneiros
Que davam com sobriedade,
Aos de casa e forasteiros
Um curso de eternidade.
A tripla, agressiva empresa
Acha que tudo se exporta
E galas da natureza
São luzes de estrela morta.
Traição? Ora, bulufas,
Ruínas, frases e ossos.
Algibeiras como estrofas
De ouro feito de destroços!
Mas eis que salta o conselho
Dos homens bons do Dphan,
No caso mete o bedelho
E na brisa da manhã
Acende um sol de esperança
Sobre a paisagem mineira.
(até onde a vista alcança,
Era dinamite e poeira.)
– o pico de Itabirito,
Este há de ser preservado
Com presença, não mito,
De um brilhante passado.
Conselho dixit. E “tombando”
A rocha, mais rocha agora.
Demonstra-nos como, quando,
Com peito, uma lei vigora.
St. John, hanna e ico, murchos,
Detêm-se para pensar.
Queimaram-se os seus cartuchos
Ou resta um jeitinho no ar?
– vamos chorar nossas mágoas
E, reforçando o lamento,
Arar em sabidas águas:
Ação, desenvolvimento!
Tudo exportar bem depressa,
Suando as rotas camisas.
Ficam buracos? Ora essa,
O que vale são divisas
Que tapem outros “buracos”
Do tesouro nacional,
Deixando em redor os cacos
De um país colonial.
Escorre o tempo. E à cantiga
Dessa viola afinada,
Já ninguém mais lembra a antiga
Voz do conselho, nem nada.
E vem de cima um despacho
Autorizando: derruba!
Role tudo, de alto a baixo,
Como, ao vento, uma embaúba!
E o pico de Itabirito
Será moído, exportado.
Só quedará no infinito
Seu fantasma desolado.
O homem e sua ganância sem freio.
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