segunda-feira, 7 de julho de 2025

A tristeza da imortalidade no conto "Centauro" de José Saramago

A figura do centauro nos remete à força, mas na lenda de Quíron, esta criatura mitológica apresenta uma faceta sombria. Ferido por uma flecha envenenada, a natureza o condenou a um sofrimento eterno. Quíron jamais morreria.

Biblioteca Pública de Boston | Unsplash

A solidão dos dias eternos em Centauro de José Saramago

No conto Centauro, José Saramago parece dialogar com essa angústia da eternidade de Quíron. Longe do heroísmo atribuído a outros centauros, o protagonista carrega o peso de uma fadiga de séculos e milênios, uma exaustão que vai além do físico e atinge a sua essência e sua existência híbrida.

O tempo foi passando. Por fim, já não lhe sobrava terra para viver com segurança. Passou a dormir durante o dia e  caminhar de noite. Caminhar e dormir. Dormir e Caminhar. Sem nenhuma razão que conhecesse, apenas porque tinha patas e sono. Comer não precisava. E o sono era necessário para que pudesse sonhar. E a água, apenas porque era a água.

segunda-feira, 30 de junho de 2025

A memória coletiva em O livro do riso e do esquecimento (Kundera)

Já sentiu como a tua história pessoal dança, às vezes de forma surpreendente e dolorosa, com os grandes eventos da história coletiva? Em O livro do riso e do esquecimento, publicado originalmente em 1978, Milan Kundera nos convida a ver a vida particular em sete narrativas interligadas.

Essas histórias revelam personagens moldados pela história do século XX, com foco na Tchecoslováquia sob o regime comunista. Exilado na França, Kundera usa a narrativa como um espelho crítico de sua terra natal.

segunda-feira, 23 de junho de 2025

Farmácia Literária: a cura pelo livro

Libreria Acqua Alta em Veneza
 Você já pensou em livros como remédios? Em vez de comprimidos, páginas. Em vez de efeitos colaterais, reflexões. Essa é a proposta do livro Farmácia Literária (2016), escrito por Susan Elderkin e Ella Berthoud, que apresenta uma abordagem muito curiosa e terapêutica: a biblioterapia.

A biblioterapia é a prática de usar a literatura como ferramenta de cura emocional e autoconhecimento. 

Combinando elementos da psicologia com o poder transformador da arte literária, Farmácia Literária se torna um verdadeiro guia de prescrição de livros — uma espécie de manual para a alma em tempos de crise, dúvida, tristeza ou alegria.

Neste livro, cada sintoma vem acompanhado de uma sugestão literária cuidadosamente escolhida. Está com o coração partido? Sofrendo de ansiedade? Sentindo-se perdido ou precisando de inspiração? Há um livro certo para cada estado de espírito! São mais de 400 opções de livros para cada tipo de sentimento.

segunda-feira, 16 de junho de 2025

Lições de "Cidadela" - Antoine de Saint-Exupéry

 Cidadela é, para mim, um dos livros mais sensíveis de Antoine de Saint-Exupéry, escritor francês mundialmente famoso pelo O Pequeno Príncipe.

São mais de seiscentas páginas de um ensaio narrado em primeira pessoa: reflexivo, filosófico, poético - mesmo em estrutura de prosa. A literatura saint-exupéryana - termo que sequer pesquisei se existe na Teoria Literária - é composta de sensibilidade.

segunda-feira, 9 de junho de 2025

Junot Díaz e a fantástica família dominicana

A fantástica vida breve de Oscar Wao (2007), escrito por Junot Díaz, é um romance que mistura tragédia e humor para contar uma história profundamente enraizada na experiência latino-americana. Embora o autor seja dominicano-americano, a narrativa atravessa as fronteiras do Caribe para tocar em temas universais — sobretudo o tal sonho americano.

Díaz também aborda as marcas deixadas pela ditadura de Trujillo na República Dominicana, as influências da vizinha Cuba, a violência, o machismo e a pobreza — tudo isso sem perder o tom sarcástico.

A capital Santo Domingo (Ronald Vargas | Unsplash)

segunda-feira, 2 de junho de 2025

"Batismo de Sangue" e a esquerda católica no Brasil

Maria Fernanda Pissioli | Unsplash

Publicado em 1982, Batismo de Sangue: guerrilha e morte de Carlos Marighella, do frade Frei Betto, é um valioso registro histórico para compreendermos a silenciosa atuação da esquerda católica durante a Ditadura Militar no Brasil. A atuação deste grupo foi profundamente marcada pela compaixão cristã, um pilar de amor, mas também de ação e revolta

Longe de se manter alheia à repressão, uma parcela significativa da Igreja Católica brasileira teceu uma rede de proteção que acolheu militantes perseguidos de todo o país e, inclusive, de outros Ditaduras pela América do Sul, oferecendo-lhes refúgio e apoio em face da violência estatal.

segunda-feira, 26 de maio de 2025

Thoreau: Maçãs silvestres e cores de outono

Desde os primórdios da literatura a natureza tem servido de inspiração para os escritores (nature writing), sendo cenário de devaneios e sentimentos dos mais ternos aos mais raivosos à luz de revoluções políticas e industriais.

Em Thoreau, sobretudo, podemos navegar entre ensaios políticos, acadêmicos, relatos de uma vida autossustentável e, como no caso de Maçãs silvestres e cores de outono, sobre macieiras e a beleza outonal. É momento de pausa, como férias da mente para aproveitar e discorrer sobre a simplicidade da vida.

segunda-feira, 19 de maio de 2025

Para cortar as amarras: Atira para o mar (Renata Pallottini)

 Quando decidimos ir, não há quem mude nossa ideia. E não há nada mais bonito que ir, respeitando a liberdade, respeitando a si mesmo - talvez o maior ato de amor e amor-próprio que podemos fazer.

Um poema sobre liberdade que mexe comigo há mais tempo do que posso lembrar é o Atira para o mar de Renata Pallottini, escritora brasileira que se destacou, sobretudo, na dramaturgia nacional. 

Dá uma lida abaixo e diz pra mim o que tu sente ao ler:

Atira para o mar as tuas coisas

abandona os teus pais

muda de nome


esquece a pátria

parte sem bagagem

fica mudo e ensurdece

abre os teus olhos.


Se o teu amor não vale tudo isso

então fica onde estás

gelado e quieto.


O amor só sabe ir de mãos vazias

e só vale se for

o único projeto.

segunda-feira, 12 de maio de 2025

Tristessa: amar também é para os beats (Kerouac)

Aquiles Carattino | Unsplash

Eu poderia, com toda a minha experiência literária e de vida em frustrações amorosas, dizer que esta foi uma paixão de cinema. Feroz, quente, carnal e frustrante. Quando Jack Kerouac se apaixonou por Tristessa, era certo que - não daria certo - seria uma paixão de tirar o fôlego até o fim.

Foi na Cidade do México que tudo começou. Bebidas, saco de dormir, dores e Tristessa. Tristessa foi uma prostituta mexicana viciada em morfina, com quem Karouac se relacionou na década de 50.

segunda-feira, 5 de maio de 2025

Nem tudo é sobre humor: charges, cartuns e tirinhas

Nem tudo é sobre fazer rir. Charges, cartuns, tirinhas ou, simplesmente, histórias em quadrinhos, são comumente associadas ao universo infantil ou geek. No entanto, se folhearmos os jornais - como na moda antiga - ou abrirmos a rede social mais próxima para observar que estes gêneros vão muito além do universo Marvel ou Disney.

Gabriel Dantas | @bifedeunicornio

Charges, cartuns e tirinhas nos fazem rir mas também refletir, seja para falar de política, celebridades e até mesmo comportamento social.

segunda-feira, 28 de abril de 2025

A nossa existência em "Danúbio" (Cladio Magris)

Se há uma coisa que não posso suportar é pensar que tudo isto amanhã será história. (Magris)

Quantas pontes deveremos atravessar para perceber a infinidade da nossa História? Danúbio é o rio que corta a porção central do continente europeu. E Danúbio é o título do livro de Claudio Magris, publicado em 1986, nos minutos finais da URSS.

Ponte UFO, construída na URSS
em Bratislava (Eslováquia)

sexta-feira, 25 de abril de 2025

O que restou do Itabirito

Minas Gerais é o berço da mineração no país e também do poeta Carlos Drummond de Andrade. Em 1965, ele escreveu um poema-alerta sobre o Pico Itabirito, um amontoado rochoso constituído de minério de ferro com aproximadamente 1586 metros de altura.

Pico Itabirito em 1956 | Vitto Rocco Melillo / IEPHA-MG

O Pico Itabirito está localizado na região da Serra das Serrinhas em Itabira, uma cidadezinha no centro de Minas Gerais. O Pico encontra-se em uma área potencialmente atrativa para as mineradoras de ferro. Em 1940, o terreno foi vendido para uma companhia britânica de mineração e atualmente pertence à Vale.

segunda-feira, 21 de abril de 2025

Althusser, Orwell e os Aparelhos Ideológicos do Estado

Esses homens ricos chamavam-se capitalistas. Eram gordos, feios, de caras perversas [...] Os capitalistas eram donos de todo o mundo, e todas as outras pessoas eram escravas deles. Eram donos de toda a terra, todas as casas, todas as fábricas, todo o dinheiro. (ORWELL, 1984)

Vivemos em um Estado, mas acima de tudo, sob o poder dele. O Estado, como um sistema movido por elementos com significância maior ou menor, funciona por suas instituições ou aparelhos, como denomina Louis Althusser. Nós vivemos e transitamos por esses aparelhos. Aqueles aparelhos ou instituições que não agem por meio da repressão física (ARE: Aparelhos Repressivos de Estado), são denominados Aparelhos Ideológicos de Estado (AIE). A forma de repressão dos AIE, é pacífica, ou seja, a ideologia ou um conjunto de ideias e ideais são impostos ou disseminados pela manipulação.

sexta-feira, 18 de abril de 2025

Vou me embora para Tatipirun

 Se existe uma terra onde todos são livres, sem julgamentos, sem guerra e sem amo é Tatipirun. Eu te garanto! Essa terra foi inventada por Raimundo, o herói dos oprimidos em A terra dos meninos pelados.

A terra dos meninos pelados é um livro escrito por Graciliano Ramos logo após ser libertado da prisão em Ilha Grande no ano de 1937. Nacionalmente conhecido por Vidas Secas (1938), o amargurado clássico da cadelinha Baleia, o livro em questão contrasta-se por ser uma obra infantojuvenil.

Ué! Mas feito fábula pra adultos, é tão necessário quanto Monteiro Lobato, Andersen, Orwell e outras recomendações da farmácia universal de literatura. Graciliano Ramos - pegue esta indicação.

segunda-feira, 14 de abril de 2025

A força llanera em "Dona Bárbara" (Rómulo Gallegos)

Publicada em 1929, Dona Bárbara é uma das principais obras da literatura venezuelana, escrita por Rómulo Gallegos (1884–1969), que também transitou pela política. Gallegos governou seu país por um breve período de oito meses (1948), interrompido por um Golpe Militar.

Para além do contexto político do autor, esta obra mergulha profundamente no modo de vida singular do homem e da mulher dos Llanos venezuelanos - os llaneros -, explorando sua relação intrínseca com a natureza da região.
Llanura venezuelana! Propícia para o esforço, como foi para a façanha, terra de horizontes abertos, onde uma raça boa ama, sofre e espera!...

sexta-feira, 11 de abril de 2025

A angústia cotidiana em "Os Ratos" (Dyonélio Machado)

Publicado em 1935, Os Ratos, de Dyonélio Machado, é um romance que mergulha na ansiedade de um homem comum diante de uma dívida aparentemente banal, mas devastadora. O protagonista, Naziazeno, representa o cidadão urbano sem privilégios, esmagado pelo sistema e pela obrigação de pagar o leiteiro.

segunda-feira, 7 de abril de 2025

Diálogo literário entre Andersen e Dostoievski

jarmoluk | pixabay

Em 1846, o renomado escritor dinamarquês Hans Christian Andersen publicou o famoso conto A pequena vendedora de fósforos. Dezenove anos depois, em 1865, o aclamado autor russo Fiodor Dostoievski lançou A árvore de Natal na casa de Cristo, uma obra que muitos consideram a "versão masculina" da narrativa de Andersen.

Entretanto, afirmar que Dostoievski apenas reescreveu a história de Andersen, substituindo a protagonista por um menino, seria uma simplificação excessiva. 

sexta-feira, 4 de abril de 2025

Ecologia, economia e política em conflito

O livro Diálogo sobre Ecologia, Ciência e Política resgata as discussões acadêmicas da Universidade Federal do Rio de Janeiro durante a Rio-92. A obra, de 1993 e extremamente atual, é voltada para acadêmicos e entusiastas foi organizada por César Benjamin e é fruto de debates do Fórum de Ciência e Cultura da UFRJ.

http://pertinenciasliterarias.blogspot.com/

As falas abordam perspectivas otimistas e pessimistas sobre os impactos da industrialização. Questiona-se os interesses por trás da degradação ambiental e analisa alternativas para equilibrar desenvolvimento econômico e preservação da natureza

segunda-feira, 31 de março de 2025

Graham Greene: “O fim da festa" e o terror infantil

O fim da festa, um conto de Graham Greene publicado em 1929, explora o terror infantil e as consequências do medo. A história gira em torno de Francis, um menino atormentado por um medo paralisante da escuridão.

Rene Terp | Pexels 

sexta-feira, 28 de março de 2025

O vazio de setembro em João Ubaldo Ribeiro

Setembro não tem sentido é o primeiro romance de João Ubaldo Ribeiro, lançado em 1968. Ambientada durante as celebrações do feriado de Sete de Setembro nos anos 60, a narrativa entrelaça duas histórias, a de Tristão, um boêmio que constantemente perturba os eventos da Semana da Pátria em Salvador com suas incessantes bebedeiras, e a de Orlando, um jornalista aposentado que vive isolado, relembrando seu passado com amargura enquanto sua sanidade se deteriora.

delírio recortado 

segunda-feira, 24 de março de 2025

O peso da maternidade em "A Filha Perdida" (Elena Ferrante)

maternidade é frequentemente retratada como um ideal de amor incondicional e realização. No entanto, A Filha Perdida (2006) de Elena Ferrante, desmonta essa romantização, expondo os conflitos internos que acompanham essa experiência.
A-filha-perdida-elena-ferrante-pertinencias-literarias-blogspot
eze_cmf | Unsplash

sexta-feira, 21 de março de 2025

"Lua crescente em Amsterdã" e os perrengues de viagem

Lua crescente em Amsterdã, conto de Lygia Fagundes Telles presente no livro Seminário dos Ratos (1977), é uma narrativa que mistura o cotidiano com o fantástico. A história acompanha um casal que, além de estar sem dinheiro, enfrenta dificuldades de comunicação em um país estrangeiro

Entre diálogos cortantes e reflexões existenciais, o conto leva o leitor a um desfecho inesperado, marcado pela metamorfose dos personagens.  

segunda-feira, 17 de março de 2025

Elisa Allen florescendo em “Os Crisântemos” (Steinbeck)

John Steinbeck é reconhecido como um dos autores mais influentes da literatura norte-americana, cujas obras são marcadas por narrativas profundas que exploram temas sociais. O conto "Os Crisântemos", publicado em 1938, aborda a questão da autonomia feminina.

Valeriia Miller | corelens

sexta-feira, 14 de março de 2025

O lar desconstruído em Apelo (Dalton Trevisan)

O pequeno conto Apelo de Dalton Trevisan aborda perda e saudade, explorando a desordem emocional e doméstica causada pela ausência de uma mulher. Através da voz de um marido aflito, Trevisan revela a dependência emocional e prática em relação à figura feminina, um reflexo dos estereótipos de gênero presentes na sociedade.

Amanhã faz um mês que a Senhora está longe de casa. Primeiros dias, para dizer a verdade, não senti falta, bom chegar tarde, esquecido na conversa de esquina. Não foi ausência por uma semana: o batom ainda no lenço, o prato na mesa por engano, a imagem de relance no espelho.

Com os dias, Senhora, o leite primeira vez coalhou. A notícia de sua perda veio aos poucos: a pilha de jornais ali no chão, ninguém os guardou debaixo da escada. Toda a casa era um corredor deserto, até o canário ficou mudo. Não dar parte de fraco, ah, Senhora, fui beber com os amigos. Uma hora da noite eles se iam. Ficava só, sem o perdão de sua presença, última luz na varanda, a todas as aflições do dia.

Sentia falta da pequena briga pelo sal no tomate — meu jeito de querer bem. Acaso é saudade, Senhora? Às suas violetas, na janela, não lhes poupei água e elas murcham. Não tenho botão na camisa. Calço a meia furada. Que fim levou o saca-rolha? Nenhum de nós sabe, sem a Senhora, conversar com os outros: bocas raivosas mastigando. Venha para casa, Senhora, por favor.

segunda-feira, 10 de março de 2025

A Cor Púrpura: resistência e empoderamento

A Cor Púrpura é um romance escrito por Alice Walker e publicado em 1982, vencedor do Prêmio Pulitzer. A obra conta a história de Celie, uma jovem afro-americana que cresce em meio à pobreza e segregação no sul dos Estados Unidos.

Ricardo IV Tamayo | Unsplash 

Desde a infância, Celie enfrenta uma realidade devastadora, marcada pelo abuso físico e psicológico de seu padrasto. Como mulher negra e pobre, vive aprisionada em um ciclo de opressão e intolerância.  

sábado, 8 de março de 2025

A Mulher Ferida e a figura paterna (Linda Leonard)

Nascemos no mesmo lar, mas não defendemos os mesmos ideais. 

Temos o mesmo sangue, mas não sentimos as mesmas coisas.

Sangue, carne, ossos, memória e trauma. (À sombra incômoda da árvore)

pertinencias-literárias-blogspot
Rubén Bagüés | Unsplash

A infância é um território que percorremos por toda a vida. Essa frase ressoou profundamente em mim ao ler A Mulher Ferida: em busca de um relacionamento responsável entre homens e mulheres (1997) de Linda Schierse Leonard, uma obra que dialoga com muitas mulheres ao abordar a influência da figura paterna em nossas vidas.

sexta-feira, 7 de março de 2025

Memória e resistência: Ainda estou aqui (Marcelo Rubens Paiva)

ainda-estou-aqui-pertinências-literárias-blog

Mais do que um livro sobre saudades, Ainda estou aqui, de Marcelo Rubens Paiva, é uma história sobre memória. 

A memória não é a capacidade de organizar e classificar recordações em arquivos. Não existem arquivos. A acumulação do passado sobre o passado prossegue até o nosso fim, memória sobre memória, através de memórias que se misturam, deturpadas, bloqueadas, recorrentes ou escondidas, ou reprimidas, ou blindadas por um instinto de sobrevivência. (p.25) 

O autor revisita o passado com um olhar especial para sua mãe, Eunice Paiva, retratada como uma mulher forte, vaidosa e destemida, especialmente após o desaparecimento e assassinato de seu marido, o ex-deputado Rubens Paiva, vítima da ditadura militar no Brasil.

segunda-feira, 3 de março de 2025

The Pearl: sonhos, ambições e perigos (Steinbeck)

Daniele Franchi | Unsplash
A Pérola (The Pearl), de John Steinbeck, é um romance estadunidense publicado em 1947 que explora os impactos da ambição e da busca por uma vida melhor. A história acompanha Kino, um pescador humilde que encontra uma pérola e vê nela a oportunidade de transformar o destino de sua família.

sexta-feira, 28 de fevereiro de 2025

Ler, transformar e transtornar

Regina Zilberman e outras vozes defensoras da leitura como instrumento de transformação pessoal e social, nos convida a refletir sobre a força dos livros e seu impacto profundo em nossas vidas. 

Em sua obra Leitura em crise na escola (1991) a autora argumenta que a literatura não apenas molda indivíduos mais conscientes e críticos, mas também oferece refúgio em meio às adversidades da realidade cotidiana. Ler é tanto uma fuga quanto um chamado à observação atenta das dinâmicas sociais, do poder, das dores e das belezas que nos rodeiam. 

segunda-feira, 24 de fevereiro de 2025

Vida e morte em “Carcassone” (William Faulkner)

O pequeno conto Carcassonne do escritor estadunidense William Faulkner foi publicado pela primeira vez em 1931, como parte de uma coleção de história que incluem A Rose for Emily e Dry September. A narrativa é repleta de metáforas, transitando entre o real e o simbólico, a fragilidade da existência e a inevitabilidade da morte. 

Alex S | Pexels 

sexta-feira, 21 de fevereiro de 2025

Existência e revolta: O homem revoltado (Camus)

Um rosto mais do que humano, triste como o universo, belo como o suicídio.
| collage: delírio recortado

O que é um revoltado? Um homem que diz não.

Falar sobre revolta é abordar a própria essência da existência humana. Desde o nascimento até a morte, vivemos em uma constante batalha de ideias, onde a mente se confronta com discursos que aceitamos ou rejeitamos, moldando nossa forma de conviver em sociedade.

Em o Homem Revoltado, Albert Camus não oferece respostas simples à vida. Ele convida à reflexão sobre a complexidade da existência, onde a revolta não é apenas um ato de oposição, mas uma declaração de que a vida, apesar de tudo, deveria ser vivida com consciência e resistência.

segunda-feira, 17 de fevereiro de 2025

Neurose de um homem só em “A Miniatura” (Elisa Palatnik)

A Miniatura (2005) é um romance cativante que combina humor ácido e suspense intrigante, escrito por Elisa Palatnik. A trama gira em torno de Emílio, um miniaturista introspectivo e neurótico que vive uma relação peculiar com Inês, sua namorada misteriosa - e alta!

Etactics Inc - Unsplash

sexta-feira, 14 de fevereiro de 2025

O que é leitura: reflexões sobre letramento

Entre os clássicos da Editora Brasiliense, destaca-se O que é Leitura, de Maria Helena Martins, pesquisadora na área de linguagens. A obra oferece uma análise profunda sobre letramento, destacando a crise da leitura que perdura há décadas. Para a autora, a habilidade de ler vai além da simples decodificação de palavras, envolve também a compreensão dos significados por trás das letras, da palavra escrita, palavra dita e da palavra viva. 

segunda-feira, 10 de fevereiro de 2025

A floresta sombria na mente de Edgar Allan Poe

Edgar Allan Poe é o mestre do suspense e da melancolia. Sendo capaz, se a sua insanidade permitir, de invadir seus sonhos com narrativas sombrias, onde paredes escondem segredos terríveis e corvos ganham um ar assassino. Na edição Poe: poemas e ensaios (1999) da Editora Globo, os poemas e ensaios são reunidos para explorar os aspectos mais melancólicos de sua obra, sem abandonar o estilo mórbido que marcou sua trajetória.

sexta-feira, 7 de fevereiro de 2025

Zygmunt Bauman: liberdade líquida em tempos modernos

Eu estava tão feliz, eu podia chafurdar na lama e aquecer-me ao sol, eu podia comer e beber, grunhir e guinchar, e estava livre de meditações e dúvidas: “O que devo fazer, isto ou aquilo?”. Por que vieste? Para jogar-me outra vez na vida odiosa que eu levava antes?

Escrevo o rascunho deste texto à mão, sentada à beira-mar em uma praia quase deserta. Hoje, optei por uma vida mais analógica, enquanto reflito sobre leitura e liberdade, inspirada pelo livro Modernidade Líquida (1999), de Zygmunt Bauman. Em tempos de consumismo desenfreado e imediatismo digital, essa escolha parece quase uma rebeldia.

segunda-feira, 3 de fevereiro de 2025

O Bilhete Premiado (Tchekhov): quando a felicidade encontra a fragilidade

@disparates.aglomerados

Anton Pavlovitch Tchekhov
(1860 – 1904) nasceu em Tagarong, cidade litorânea da Rússia, mais tarde foi para Moscou estudar medicina. Para se sustentar, escrevia em periódicos, a maioria de seus escritos da época (entre 1880) eram humorísticos. Por alguns anos atuou na área da medicina, mas entre 1885-87 Tchekhov decidiu se aprofundar na literatura e com uma temática mais séria. Foi em 87 também que ele escreveu O Bilhete Premiado.

sexta-feira, 31 de janeiro de 2025

Desertores da estética | PIXAÇÃO: A arte em cima do muro

Contra o muro podem
Islington, Londres 

encostar-se indivíduos 
em ato de fuzilamento.
Também se pode em um muro
dizer, em cartazes ou letras 
pintadas, palavras como “Paz”, “Merda” ou “Viva a Democracia". 
Mas há o outro lado:
O lado de um muro onde moram as pessoas 
que amam, trabalham e sofrem 
– por sobre o qual (lado) 
se acredita a linha estendida 
de um presente mar-horizonte 
na distancia interior 
dos sonhos e das criações.
Silveira de Souza / Hassis

ARTE. Como uma palavra tão curta pode carregar tantos significados e preconceitos, não é mesmo? Quando pensamos na arte marginalizada da pixação e a comparamos com o graffiti, fica claro como manifestações artísticas similares geram percepções opostas. A pixação, com seu caráter rebelde, confronta diretamente o graffiti, muitas vezes confundido com ela.

PIÁ, Joinville (SC)

Luiz Henrique Pereira Nascimento — filósofo, ativista, professor e artista — dedicou três anos ao estudo da pixação e lançou o livro PIXAÇÃO: A arte em cima do muro (2015), no qual aborda profundamente essa forma de arte marginalizada feito pelos pichadores, desertores da estética artística tradicional.

segunda-feira, 27 de janeiro de 2025

Byron e o orgulho de guerra

Theodoros Vryzakis (Domínio Público)

O poema Neste dia eu completo meu 36º aniversário foi escrito por Lord Byron em 1824, durante seus últimos dias na Grécia, enquanto lutava pela independência do país. É uma obra profundamente introspectiva, que reflete o estado emocional do escritor inglês  em sua maturidade, marcada por arrependimentos, solidão e uma busca por propósito.

sexta-feira, 24 de janeiro de 2025

Análise breve de Misto-quente (Bukowski)

Heinrich Karl Bukowski nasceu em Andernach, Alemanha, em 1920. Aos 3 anos, mudou-se para os Estados Unidos. Pequeno demais para viver a Era do Jazz, Bukowski seguiu por linhas mais outsiders e mundanas. Viveu por 50 anos em Los Angeles e faleceu em 9 de março de 1994, aos 73 anos.  

Joshua Coleman - Unsplash
Conhecido literalmente como Charles Bukowski, o escritor publicou seu primeiro conto aos 24 anos. Sua literatura é marcada por um tom autobiográfico, abordando temas e personagens marginais, como prostitutas, sexo, alcoolismo, pessoas miseráveis e experiências escatológicas.  

Seu romance Ham on Rye (1982), em português Misto-quente um exemplo e resumo notável de sua literatura. Trata-se de um romance semi-autobiográfico que apresenta Henry Chinaski, o alterego de Bukowski. 

segunda-feira, 20 de janeiro de 2025

Alberto Caeiro: o poeta da natureza

Alberto Caeiro, o famoso Guardador de Rebanhos, é um dos heterônimos mais icônicos de Fernando Pessoa. Caeiro nasceu para a simplicidade pura e a conexão direta com a natureza

Não teve profissão, nem educação quase alguma, só instrução primária; morreram-lhe cedo o pai e a mãe, e deixou-se ficar em casa, vivendo de uns pequenos rendimentos.

(Trecho da carta de Fernando Pessoa a Adolfo Casais Monteiro, de 13 de Janeiro de 1935.)

Este heterônimo é apresentado como um homem que viveu no campo, sem grandes ambições ou formações acadêmicas.

sexta-feira, 17 de janeiro de 2025

Jan D. Matthews: uma nova pedagogia para destruir a escola tradicional

O livro Para Destruir a Escolarização, de Jan D. Matthews, é um convite para uma reflexão profunda sobre a pedagogia clássica e moderna, questionando suas bases e relevância no mundo contemporâneo. Será mesmo que a "nova escola" é nova? E que ela ainda seja capaz de atender às demandas do indivíduo -  algum dia ela realmente atendeu?

Ken Elias (1977)

segunda-feira, 13 de janeiro de 2025

A maldade humana em “O Demônio da Perversidade” (Poe)

Publicado em julho de 1845, O Demônio da Perversidade é uma obra de Edgar Allan Poe que começa como um ensaio filosófico, mas se transforma em uma narrativa envolvente. Combinando elementos psicológicos e metafísicos, o conto explora as profundezas da mente humana e a inquietante atração pelo autossabotagem.

sexta-feira, 10 de janeiro de 2025

A memória e a saudade em “Istambul” (Orhan Pamuk)

danilowoz (2022)
O que permanece e o que já se perdeu entre esquinas, festas de aniversário e encontros? O passado deixa marcas, evocando a nostalgia que nos acompanha.  

O livro Istambul: memória e cidade (2003), do escritor Nobel Orhan Pamuk, é uma obra profundamente impregnada pelo sentimento de saudade, que se revela tanto na relação do autor com a cidade quanto em sua própria trajetória pessoal. 

segunda-feira, 6 de janeiro de 2025

“The Flea”, de John Donne: a poesia metafísica em destaque

Foto de CDC - Unsplash

Parece que foi ontem a aula de Literatura Inglesa... Hoje, revisito com você um dos grandes expoentes da poesia metafísica: o poeta-pastor quinhentista John Donne (1572-1631). Protestante, nascido em Londres, Donne é conhecido por sua habilidade em transformar conceitos cotidianos em metáforas profundas. 

Um exemplo clássico dessa habilidade está no poema The Flea ou A Pulga, onde um simples inseto se torna o centro de uma reflexão sobre amor, desejo e as convenções sociais.