segunda-feira, 3 de novembro de 2025

Sobre aquele que nunca ganhou o Nobel, sobre Jorge Luis Borges

O pensamento do escritor argentino Jorge Luis Borges está vivo. Ele se encontra na extensa coleção da Editora Martin Claret com o título O Pensamento Vivo

Imagens repetidas do escritor Jorge Luis Borges

Essa é uma coletânea de pensamentos, aforismos, citações e frases notáveis do escritor, que faleceu um ano após o publicação do livro da Martin Claret, em 1986, aos 86 anos. Ela vai reunir em um formato que lembra os jornais dos anos 70 ou suplementos literários, de uma forma muito dinâmica e extensa, mas sem cansar o leitor. Para além da estrutura, que vai se manter a mesma como o restante da coleção, esse livro dá impressão de estarmos na escrivaninha deste escritor argentino, ouvindo suas opiniões e histórias.

segunda-feira, 27 de outubro de 2025

Deus não conversa, um livreto de Pedro Port

Há poucos anos atrás, minha irmã voltou de Floripa com um livreto alaranjado, seu título era Deus não conversa. Era um livro do poeta gaúcho Pedro Port, publicado pela Edições Delos, uma iniciativa própria do autor com apoio do artista franco-manezinho Rodrigo de Haro (1939-2021) e Idésio Leal, também da Ilha.

Pela finura do livreto, que se mescla aos zines e livros mais grossos, Deus não conversa perdeu-se na estante. Mas reencontrado, agora encontra, aqui no blog, um lugar. 

Seja bem-vindo, Pedro Port.

Quem é Pedro Port?

livro fino com homem desenhado em traços na capa

Pedro Port nasceu no ano de 1941 em Cachoeira do Sul, no Rio Grande do Sul, cidade cortada pelo rio Jacuí na porção central do estado. Academicamente, formou-se em Filosofia pela federal gaúcha e, partindo para literatura, cursou pós-graduação na área na UFSC. 

A carreira literária, a qual importa aqui, iniciou em 1964, em uma antologia poética (Poesia Vezes Três). E a partir dali, deslanchou-se em outros escritos e publicações.

Assim como muitos, chegou em Florianópolis e ancorou por lá. Tanto que, foi em Floripa que minha irmã encontrou o livro laranja, numa formato bem artesanal, fazendo jus à poesia de bar, de rua, de mercado, de praça e de quintal.

Tentei buscar por onde anda Pedro Port, mas infelizmente não encontrei informações atualizadas sobre o poeta até o final deste post (26/10/2025).

segunda-feira, 20 de outubro de 2025

Notas sobre a não-linguagem artística (João Francisco Duarte Jr.)

cadeira sendo pintada com tinta óleo
Época Mouco
O professor João Francisco Duarte Júnior tem em seu currículo a Psicologia, mas dedicou-se à Arte-educação e à Filosofia da Educação para preencher as lacunas científicas do Brasil quanto ao tema quase inexplorado na década de 80. Por que arte-educação? (1983) é um livro do século passado que ainda traz à tona tanto a questão curricular como visão popular da arte. 

Duarte Júnior vai então adotar uma abordagem reflexiva contínua, a posição da arte na escola, a formação docente e a própria essência da arte. Para valorizar e ensinar de forma eficaz, é importante ir além de definições superficiais e abraçar sua complexidade. E é isso que Duarte Júnior propõe neste livro breve, didático e provocativo

segunda-feira, 13 de outubro de 2025

Personagens e histórias: O olho da rua por Eliane Brum

Livro com capa de grafite de olhos

Eliane Brum não é apenas o olho, ela sente e ecoa a pulsação da rua. Em O olho da rua: uma repórter em busca da literatura da vida real, lançado em 2017, a jornalista gaúcha coloca em folhas o que há de mais bonito nos gêneros informativos, o jornalismo literário. Ela une a inquietude e a técnica da escrita para criar revelar a vida que poucos veem ou querem ver (neste caso, ler).

Nesta coletânea de reportagens Brum não se esconde, mas se insere na própria história. O olho da rua é uma plataforma para vozes e lugares marginalizados. É a observação jornalística combinada com uma escrita pessoal e reflexiva, oferecendo um olhar necessário sobre a realidade brasileira, sobretudo da região Norte do país.

segunda-feira, 6 de outubro de 2025

Sair catando mato - experiência de leitura As Plantas Curam

Livro com plantas na capa e também ao fundo

Pode parecer tolice compartilhar esta experiência, mas ultimamente tenho me permitido ser mais autêntica do que teórica ao falar sobre livros aqui no blog Pertinências Literárias. Minha leitura mais recente foi no meio do mato, com o livro nas mãos, faminta e sedenta por conhecimento.

Há tempos observo na natureza uma força comparável a de muitos remédios. Não me agrada o termo poder, pois me faz sentir excessivamente crente em algo, inclusive ao me referir a este livro, As Plantas Curam (1992).

Fui à biblioteca em busca de um tema: plantas e seus efeitos benéficos no corpo humano. Foi aí que encontrei As Plantas Curam, um livro de Alfons Balbach, um pastor-escritor como qualquer outro, como C.S. Lewis ou, ainda que não Pastor, mas ligado à religião, Frei Betto (escrevi sobre o clássico necessário Batismo de Sangue aqui).

segunda-feira, 29 de setembro de 2025

O tragicômico em Gaetaninho (Alcântara Machado)

Cartaz de funerária no uruguay
Funerária em Aiguá, interior do Uruguay.

Quem nunca teve um desejo minimamente mórbido? Bem, quase ninguém, acredito. E, ainda se o tivesse, talvez não ousaria contar. Por isso, creio que é difícil colocar em planilhas esse fato.

Mas com Gaetaninho é diferente. Uma boleia num carro fúnebre era seu sonho de menino.

Ali na Rua Oriente a ralé quando muito andava de bonde. De automóvel ou carro só mesmo em dia de enterro. De enterro ou de casamento. Por isso mesmo o sonho de Gaetaninho era de realização muito difícil. Um sonho.

Gaetaninho é um conto Modernista de Alcântara Machado, datado de 1927. É uma história simples, curta e grossa trágica sobre um garoto pobre que vive em um mundo onde carros são privilégios modernistas.

segunda-feira, 22 de setembro de 2025

Tempo e memória: notas sobre Primavera num espelho partido (Mario Benedetti)

sinto-me estranho mas já vai passar / não se morre de estranheza, mas pode-se morrer de saudade (p. 237)

Falar de luta e saudade é falar da América Latina desestruturada pela Ditadura Militar. Em Primavera num espelho partido (1982), o escritor uruguaio Mario Benedetti explora as diferentes perspectivas sobre o encarceramento de Santiago, personagem-preso-político, e como sua ausência afeta a vida de quem sente pela sua falta. O livro aborda o amor, fidelidade, a passagem do tempo e as escolhas enfrentadas por aqueles que esperam por alguém

segunda-feira, 15 de setembro de 2025

Anarquismo: incendiário e libertador por Cindy Milstein

Cemitério dos Imigrantes em Joinville (SC)

O que é necessário para entender uma ideologia que pulsa feito coração? Isso tudo porque falamos de LIBERDADE.

Cindy Milstein, autora na série "Lexicon", traduzida pela Editora Monstro dos Mares, define o anarquismo como a busca por uma sociedade de indivíduos livres. Para ela, não se trata apenas de uma teoria, mas de um sentimento profundamente humano que se manifesta na busca por liberdade, justiça e solidariedade para todos.

segunda-feira, 8 de setembro de 2025

O que é Poesia? Uma leitura de Afrânio Coutinho

Ninguém manda no meu poema
Afrânio Coutinho passou anos a facilitar o entendimento dos gêneros literários. Esta dedicação científica-literária pode ser acessada em sua obra mais conhecida, Notas da Teoria Literária (1976).

Neste texto, faço um recorte do que ele define POESIA. Separei em duas partes: a lírica. a forma e a expressão.

Lirismo

A poesia, em sua essência, é uma forma literária que busca expressar sentimentos, geralmente por meio de versos ritmados e organizados. Em suas origens, a poesia era cantada, daí o termo "lirismo", que vem justamente da lira, instrumento musical utilizado pelos gregos na declamação de versos. 

Assim, desde o início, o ritmo e a emoção foram pilares fundamentais da tão consagrada poesia.

segunda-feira, 1 de setembro de 2025

Viagem: Auguste de Saint-Hilaire ao Brasil

Em 1820, o botânico e naturalista francês Auguste de Saint-Hilaire chegou ao Brasil em uma viagem que marcaria profundamente os registros científicos e culturais da época. Seus relatos, mais tarde reunidos em livros e traduzidos no Brasil, oferecem uma visão rica e detalhada das províncias do Sul e Sudeste, além do Goiás. Um desses destinos foi a cidade de São Francisco do Sul, em Santa Catarina, e é justamente sobre essa parte da viagem que nos debruçamos aqui.

Viajante Cientista

Saint-Hilaire (1779–1853) não era um turista! Com o olhar treinado pela ciência, ele registrava tudo: da flora e fauna locais até os hábitos dos habitantes. Sua obra atravessa os campos da botânica, zoologia, geografia e história, sendo uma das mais valiosas fontes do Brasil oitocentista.

Em 1820, quando visitou a Província de Santa Catarina, ela se dividia em apenas três cidades principais: São Francisco (no litoral Norte), Nossa Senhora do Desterro (atual Florianópolis) e Laguna (na região Sul do estado).

segunda-feira, 25 de agosto de 2025

Um texto didático, Um apólogo (Machado de Assis)

Um Apólogo, de Machado de Assis, é um apólogo, um texto com personagens inanimados. A história se desenrola a partir de uma conversa, minimamente narcisista, entre uma agulha e uma linha.

Era uma vez uma agulha, que disse a um novelo de linha:

— Por que está você com esse ar, toda cheia de si, toda enrolada, para fingir que vale alguma coisa neste mundo? 

As duas atravessam a narrativa discutindo sobre a importância de cada uma no processo de costura de um vestido. Entre jogos de orgulhos, as duas defendem seu trabalho na costura do vestido da baronesa.

segunda-feira, 18 de agosto de 2025

A História das Coisas: a obsolescência programada e todas as coisas

Depois do documentário, A História das Coisas (The Story of Stuff) de Annie Leonard teve sua versão em livro. Na minha adolescência, uma fase de descobertas e questionamentos, fui apresentada ao documentário e posteriormente ao livro. Nos meus 14, não posso negar que essas leituras (tanto do livro como do doc), se destacaram para alguém que se questionava sobre o mundo de uma maneira crítica (pra não dizer de uma maneira quase-CHATA).

O livro, baseado na pesquisa de Annie Leonard, traz de forma acessível o funcionamento da economia global, da extração de recursos naturais ao descarte final dos produtos. Ele tece uma crítica ao modelo de produção e consumo capitalista que prioriza o lucro acima da sustentabilidade ambiental e da justiça social.


segunda-feira, 11 de agosto de 2025

Italo Calvino, o inventor de cidades

Um dia o escritor Italo Calvino teve um sonho, nesse sonho, cidades estranhas se erguiam, com peculiaridades nunca vistas antes. Não foi assim que nasceu o livro As cidades invisíveis (1972) mas eu gosto de imaginar que foi...

Pensar em As cidades invisíveis é pensar num sonho surrealista. Por que não dizer que Italo Calvino tende a ser surrealista na escrita deste livro? Criar cidades não é um ato megalomaníaco (não nesta obra!), mas uma possibilidade de invenção onde o território livre da mente se faz necessário.

Ândria foi construída com tal arte que cada uma de suas ruas segue a órbita de um planeta e os edifícios e os lugares públicos repetem a ordem das constelações e a localização dos astros mais luminosos: Antares, Alpheratz, Capela, as Cefeidas. O calendário da cidade é regulado de modo que trabalhos e ofícios e cerimônias se disponham num mapa que corresponde ao firmamento daquela data: assim, os dias na terra e as noites no céu se espelham. (p.136)

segunda-feira, 4 de agosto de 2025

Fascista em pele de porco e a fábula distópica de George Orwell

A Revolução dos Bichos, de George Orwell, é um dos livros mais famosos do autor e também considerado um clássico moderno da literatura inglesa. No imaginário literário, Animal Farm nada mais é que uma fábula distópica.

Orwell, neste pequeno romance, utiliza os recursos de fábula e com sua maestria satírica, veste proletários, ditadores e tiranos em peles de porcos, cavalos e outros animais. Isso tudo para denunciar, com toda licença poética que lhe foi permitida, os ciclos de opressão e poder na Historia mundial.

segunda-feira, 28 de julho de 2025

Cuidado com os Capitães da Areia

Joshua Woroniecki | Unsplash
Capitães da Areia (1937), é um clássico de Jorge Amado e também da literatura brasileira. A leitura deste livro exige atenção, como quem caminha pelos cantos e cais de Salvador com olhos bem abertos.

Em poucas páginas, os garotos de rua tomam o leitor de assalto, não com violência gratuita, mas com a urgência de quem nunca teve tempo para ser criança.
Desde pequenos, na arriscada vida da rua, os Capitães da Areia eram como homens, eram iguais a homens. Toda a diferença estava no tamanho. No mais, eram iguais: amavam e derrubavam negras no areal desde cedo, furtavam para viver como os ladrões da cidade. Quando eram presos apanhavam surras como os homens. Por vezes assaltavam de armas na mão como os mais temidos bandidos da Bahia. Não tinham também conversas de meninos, conversavam como homens. Sentiam mesmo como homens. Quando outras crianças só se preocupavam com brincar, estudar livros para aprender a ler, eles se viam envolvidos em acontecimentos que só os homens sabiam resolver. Sempre tinham sido como homens, na sua vida de miséria e de aventura, nunca tinham sido perfeitamente crianças. (p. 244)

segunda-feira, 21 de julho de 2025

Primavera Negra, a estação mais vazia de Henry Miller

Neste vômito nasci, e neste vômito morrerei.

Para os amantes da literatura modernista e da prosa experimental, Henry Miller oferece sempre uma experiência visceral, onde a beleza poética encontra uma luz no fim do túnel do esgoto. Em Primavera Negra, livro publicado em 1936, essa literatura não é diferente.
Agora eu nunca estou sozinho. Na pior das hipóteses estou com Deus! 
Alexander Zvir | Unsplash

segunda-feira, 14 de julho de 2025

A cor triste de Tsukuru Tazaki ou notas de Murakami

Este texto é sobre um livro triste. Ou seria apenas sobre a vida? Falo aqui de uma tristeza moldada por silêncios, abandonos e pela forma como aprendemos a perceber a dor. 

O incolor Tsukuru Tazaki e seus anos de peregrinação (2014), do escritor japonês Haruki Murakami é obra que não fala apenas sobre perda, mas sobre o que significa ser deixado para trás e ainda assim continuar existindo.

Nas mais de trezentas páginas, Tsukuru, o protagonista melancólico, caminha de mãos dadas com a solidão. O ponto de partida é um abandono marcante na juventude, não de família, mas de amigos. Em um momento de transição da adolescência para a vida adulta, Tsukuru é expulso, sem explicações, do círculo de quatro amigos que pareciam inseparáveis. Esse grupo tinha cor (Vermelho, Azul, Preta e Branca) enquanto ele era o incolor

Lex Sirikiat | Unsplash

segunda-feira, 7 de julho de 2025

A tristeza da imortalidade no conto "Centauro" de José Saramago

A figura do centauro nos remete à força, mas na lenda de Quíron, esta criatura mitológica apresenta uma faceta sombria. Ferido por uma flecha envenenada, a natureza o condenou a um sofrimento eterno. Quíron jamais morreria.

Biblioteca Pública de Boston | Unsplash

A solidão dos dias eternos em Centauro de José Saramago

No conto Centauro, José Saramago parece dialogar com essa angústia da eternidade de Quíron. Longe do heroísmo atribuído a outros centauros, o protagonista carrega o peso de uma fadiga de séculos e milênios, uma exaustão que vai além do físico e atinge a sua essência e sua existência híbrida.

O tempo foi passando. Por fim, já não lhe sobrava terra para viver com segurança. Passou a dormir durante o dia e  caminhar de noite. Caminhar e dormir. Dormir e Caminhar. Sem nenhuma razão que conhecesse, apenas porque tinha patas e sono. Comer não precisava. E o sono era necessário para que pudesse sonhar. E a água, apenas porque era a água.

segunda-feira, 30 de junho de 2025

A memória coletiva em O livro do riso e do esquecimento (Kundera)

Já sentiu como a tua história pessoal dança, às vezes de forma surpreendente e dolorosa, com os grandes eventos da história coletiva? Em O livro do riso e do esquecimento, publicado originalmente em 1978, Milan Kundera nos convida a ver a vida particular em sete narrativas interligadas.

Essas histórias revelam personagens moldados pela história do século XX, com foco na Tchecoslováquia sob o regime comunista. Exilado na França, Kundera usa a narrativa como um espelho crítico de sua terra natal.

segunda-feira, 23 de junho de 2025

Farmácia Literária: a cura pelo livro

Libreria Acqua Alta em Veneza
 Você já pensou em livros como remédios? Em vez de comprimidos, páginas. Em vez de efeitos colaterais, reflexões. Essa é a proposta do livro Farmácia Literária (2016), escrito por Susan Elderkin e Ella Berthoud, que apresenta uma abordagem muito curiosa e terapêutica: a biblioterapia.

A biblioterapia é a prática de usar a literatura como ferramenta de cura emocional e autoconhecimento. 

Combinando elementos da psicologia com o poder transformador da arte literária, Farmácia Literária se torna um verdadeiro guia de prescrição de livros — uma espécie de manual para a alma em tempos de crise, dúvida, tristeza ou alegria.

Neste livro, cada sintoma vem acompanhado de uma sugestão literária cuidadosamente escolhida. Está com o coração partido? Sofrendo de ansiedade? Sentindo-se perdido ou precisando de inspiração? Há um livro certo para cada estado de espírito! São mais de 400 opções de livros para cada tipo de sentimento.